Um filme de resistência Em debate realizado após a exibição de Era o Hotel Cambridge, arte e coletividade emergem como formas de resistência política
Diante da curiosidade do público, Caffé detalhou um pouco mais o processo de realização da obra, explicando a parceria desenvolvida entre a Faculdade de Arquitetura da Escola da Cidade, a Frente de Luta pela Moradia (FLM) e o Grupo dos Refugiados Imigrantes Sem Teto (GRIST). Segundo a diretora, a intenção original era se prender mais ao roteiro, mas, diante dos laços que se formaram durante a convivência entre a ocupação e a equipe de filmagem, e as constantes e incontroláveis mudanças que ocorriam no meio, o projeto começou a se transformar. “Fazer um filme num universo pré-estabelecido exige formar vínculos e se permitir perder o controle que o roteiro dá. Há coisas nesse filme que a gente jamais poderia escrever. Quando elas acontecem, cabe a nós segui-las”, afirmou.
A equipe presente, composta ainda pela diretora de arte Carla Caffé e o produtor André Montenegro, contou que surgiu então a ideia de criar oficinas para encontrar personagens para o filme dentro da própria ocupação, e que os alunos da Escola da Cidade foram convidados para, após um longo período de vivência e estudo no local, desenvolver cenários que pudessem servir aos moradores após a conclusão das filmagens. “Acreditamos que a arquitetura tem uma função social”, declarou o diretor da escola, Ciro Pirondi.
Diante das perguntas sobre o trabalho realizado com diversificado elenco, tomaram a palavra os atores José Dumont, Isam Issa, Carmen Silva e Preta Ferreira. Dumont, único ator profissional entre eles, destacou as semelhanças que os unem: “Eu também sou refugiado. Vim da roça, sou autodidata, também vivi essa luta. E todos nós somos atores diante da vida”. Silva, por sua vez, declarou que interpretar ela mesma foi fácil e aproveitou para agradecer pela oportunidade de mostrar sua realidade: “Os membros do nosso movimento são vistos como vândalos, como criminosos. Os verdadeiros vilões são outros”, afirmou, sob aplausos entusiásticos.
O entusiasmo também sucedeu a fala de Issa, que descreveu o filme como “um ataque da arte contra as más condições de vida no mundo todo”. A diretora reiterou, declarando que disponibiliza Era o Hotel Cambridge como instrumento de resistência política, e o mediador Átila Roque, diretor executivo da Anistia Internacional no Brasil, fechou o debate lembrando que “antes de mudar o mundo, precisamos imaginá-lo. É para isso que existe a arte”.Texto: Clara Ferrer
Fotos: Pedro Ramalho
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