Os ritmos latentes do sertão brasileiro O documentário Super Orquestra Arcoverdense de Ritmos Americanos traz um retrato poético de um sertão em constante transformação
No debate que se seguiu à sessão, mediado pelo crítico de cinema Pablo Villaça, o diretor Sérgio Oliveira disse que seu recorte temático inicial, que acompanharia apenas a SuperOARA, mudou significativamente ao longo do processo de pesquisa e filmagens. Durante os mais de dois anos de viagens seguidas à cidade, a obra acabou se tornando “um documentário sobre um sertão em transformação”.
Os elementos de que Oliveira se vale para construir o espaço da cidade formam uma seleção completamente heterogênea, que se estende da música norte-americana da orquestra de baile até a presença recorrente dos jumentos nas ruas, passando ainda por antigas tradições folclóricas como o bumba meu boi e pelas obras paradas da ferrovia Transnordestina. A grande mistura que compõe esse retrato do sertão expressa a intenção do diretor de construir um “universo sertanejo que já foi globalizado há muito tempo”. Para ele, tal região tem uma cultura pulsante e miscigenada, muito distante do imaginário de pureza cultural, sofrimento e escassez associado a ele.
O caráter formalista do documentário e a ausência das entrevistas típicas do gênero foi observado por Villaça, que elogiou também a reflexão que a obra provoca através da imagem e da trilha. O mediador apontou ainda a relação de contraposição de elementos tão diferentes entre si, que se manifestam tanto no interior dos planos quanto na sucessão deles, e indagou sobre o processo de montagem. Oliveira informou que algumas das contradições presentes nas imagens foram acidentais e, outras, planejadas pela equipe. Ele caracterizou estas últimas como “reprodução de fatos que acontecem na cidade” e ressaltou o compromisso delas com o cotidiano observado. O diretor afirmou considerar a montagem como uma junção de “fatos isolados que têm uma relação entre si” e declarou ter se deparado com muitas dificuldades durante a edição do material, devido ao caráter esparso da geografia sertaneja, que dificulta a construção dessa relação.O diretor, que se disse influenciado pelo trabalho do geógrafo Milton Santos e pelo etnodocumentário A invenção do sertão, afirmou que a relação com o espaço é um tema frequente em sua obra, citando trabalhos anteriores, como Praça Walt Disney. Oliveira questionou ainda o próprio conceito de geografia: para ele, essa não é uma ciência que trata dos espaços, mas sim do que está inserido neles.
Texto: Duda Gambogi
Fotos: Pedro Ramalho
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