Nos extremos da tecnologia da informação Carlos Alberto Mattos comenta Eis os Delírios do Mundo Conectado, de Werner Herzog
Por Carlos Alberto Mattos
Os documentários de Werner Herzog se caracterizam não tanto pelos temas insólitos, mas pela maneira peculiar com que ele os aborda. Há sempre um misto de curiosidade intelectual e ironia no seu olhar. Seu interesse se dirige sempre aos extremos de cada assunto, assim como seus filmes de viagem vão aos extremos do planeta. Ao se debruçar sobre a internet em EIS OS DELÍRIOS DO MUNDO CONECTADO, Herzog procura o mais pitoresco e inusitado, mesmo que à custa de uma certa banalização. O filme combina explanações um tanto áridas sobre o funcionamento de sistemas e algoritmos com observações bem-humoradas acerca da tecnologia da informação.
O léxico herzoguiano está presente, por exemplo, na abertura solene ao som de Wagner, logo desmontada por uma anedota sobre os primórdios da internet. Ou no contraste entre a habitual narração circunspecta do diretor e as imagens que a sucedem e desconstroem. Tomem-se, ainda, as intervenções autorreferentes de Herzog, seja oferecendo-se para viajar a Marte com um passagem só de ida ou duvidando que algum robô possa um dia fazer filmes melhor do que ele. Entre as excentricidades coletadas estão os pacientes de uma clínica de reabilitação para viciados em internet e celular, e uma família que demoniza a web desde que uma foto da filha decapitada num acidente viralizou e rendeu mensagens de ódio. Nessa sequência, a mais estranha do filme, o grupo familiar é filmado em posição hierática com uma mesa coberta de doces e bolos em primeiro plano.
Outros tipos singulares passam pela tela. Hackers, eremitas, designers de robôs e cientistas de fala histriônica compartilham seus feitos e inquietações. O mundo, para Herzog, é um lugar extravagante, habitado por um bando de malucos e gênios de aparência bizarra. O apocalipse nunca está descartado de suas indagações. Aqui ele especula sobre o fim do mundo caso o sol exploda e a internet saia do ar. Chega a filmar uma Chicago vazia como se os habitantes houvessem todos emigrado para outros planetas, restando apenas um punhado de monges tuiteiros. Mais do que um ensaio cuidadoso e sério sobre a vida digital, o documentário é uma coleta de curiosidades e conjecturas. Um painel às vezes muito divertido, mas quase sempre ligeiro e superficial.
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