Mestres do documentário marcam presença no Festival Mostra especial exibirá filmes de nomes de peso como Frederick Wiseman, Nicolas Philibert e Errol Morris, além dos novos filmes de Ken Loach e Werner Herzog
Esse ano já pode ser considerado bastante especial para os fãs de documentários. Alguns dos principais documentaristas em atividade estão com filmes novos esse ano: Frederick Wiseman, Nicolas Philibert, Errol Morris, Rithy Panh e Claude Lanzmann. Além disso, três cineastas de peso, tanto na ficção quanto no documentário, também lançam seus novos trabalhos no gênero: Marcel Ophuls, Ken Loach e Werner Herzog. Para celebrar esta safra tão especial, o Festival do Rio decidiu criar, esse ano, a mostra especial Panorama – Grandes Documentaristas.
Em Berkeley, novo de Frederick Wiseman, dá continuidade à sua exploração das instituições norte-americanas a partir dos princípios do Cinema Direto, movimento do qual é um dos principais mentores com filmes como Titicut Follies, High School e Primata. Sua câmera-mosca desta vez se posiciona pelas salas de aula, corredores, jardins e outros cantos da Universidade de Berkeley, na Califórnia. Em quatro horas de filme, o cineasta avalia o estrago que a crise econômica vem fazendo nas instituições de ensino do país. Do alto de seus 83 anos, Wiseman continua a pleno vapor, tendo lançado recentemente obras como State Legislature, La danse e Crazy Horse.
O francês Nicolas Philibert desenvolveu sua carreira como documentarista seguindo muitos dos princípios de observação do Cinema Direto. Foi assim que registrou os processos internos do Louve em A cidade Louvre ou de uma escola do interior da França em Ser e ter. Agora, ele volta sua câmera para os bastidores da Radio France, maior grupo de comunicação estatal do país, em A estação de rádio, selecionado para a mostra Panorama do Festival de Berlim desse ano.
Já no Festival de Veneza, que começou semana passada e segue até o dia 7, será exibido o novo trabalho de Errol Morris, em competição. O diretor transformou o mundo dos documentários em 1988, com A tênue linha da morte, produzido depois de seis anos trabalhando como detetive. O filme resultou na libertação de um homem injustamente condenado à morte. Morris é também o criador de um dispositivo conhecido como Interrotron, parecido com um teleprompter que, acoplado à câmera, mostra a imagem do diretor logo abaixo da lente, deixando o entrevistado sozinho no cômodo onde a entrevista acontece. O dispositivo não só deixa o entrevistado mais à vontade, como também o coloca olhando direto para a câmera, ainda que esteja de frente para o rosto do diretor.
É com essas credenciais que Morris volta a entrevistar um ex-Secretário de Defesa dos Estados Unidos. Em A névoa da guerra (Oscar de melhor documentário), o cineasta já entrevistara Robert McNamara, que esteve à frente do cargo durante as presidências de John Kennedy e Lyndon Johnson. Agora, seu foco de interesse é Donald Rumsfeld, Secretário dos governos Geralrd Ford (entre 1975 e 1977) e George W. Bush (de 2001 a 2006), e um dos principais nomes por trás da Guerra do Iraque. O conhecido desconhecido: A era Donald Rumsfeld é desde já um dos filmes mais aguardados do ano.
E a festa dos documentários não para por aí. Outro mestre do cinema, tanto no documentário quanto na ficção, Ken Loach dirigiu O espírito de 45, profunda análise das mudanças na sociedade inglesa a partir do ano de 1945, quando a Segunda Guerra chegou ao fim. A partir de uma extensa quantidade de material de arquivo e entrevistas, o filme joga luz sobre uma época essencial para a formação do país, com impactos que ainda perduram até hoje, como a criação do Estado de bem-estar social. O longa foi selecionado para o Festival de Berlim.
Já diretamente de Cannes, o Festival do Rio vai exibir A imagem que falta, de Rithy Panh, vencedor do prêmio de melhor filme na mostra Um Certo Olhar. Em seu nono longa-metragem, o cineasta cambojano evoca em primeira pessoa um episódio recorrente em sua obra: o genocídio khmer, que dizimou sua família e transtornou sua infância. Após anos de buscas por imagens ou fotos que exprimissem a dor e o sofrimento do período, o diretor resolveu criar suas próprias, na composição de um filme que, segundo a definição do próprio, “não é a imagem final, nem a busca de uma única imagem, mas a imagem objetiva de uma busca: a busca que o cinema permite”.
Mantendo o tom de entrega pessoal, a mostra contará ainda com O viajante, de Marcel Ophuls, misto de autobiografia e revisão de sua relação com o cinema. Exibido na Quinzena dos Realizadores de Cannes, o filme se constrói a partir de conversas do cineasta, filho do mestre Max Ophuls, discorrendo sobre nomes como Jeanne Moreau, Bertold Brecht, Ernst Lubitsch, Otto Preminger, Woody Allen, Stanley Kubrick e seu grande amigo François Truffaut.
Da França vem também O último dos injustos, dirigido por Claude Lanzmann (do clássico Shoah), que retoma uma série de entrevistas feitas em 1975 com Benjamin Murmelstein, um dos únicos “velhos judeus”, segundo definição nazista, a não ser assassinado durante a Segunda Guerra. Lanzmann retorna a Theresienstadt, cidade na República Tcheca, que nasceu como um gueto-modelo para judeus criado por Hitler. O cineasta explora a cidade como ela é hoje a partir daquelas entrevistas com Murmelstein, quase quatro décadas atrás. O filme também esteve em Cannes, exibido fora de competição.
Por fim, outro mestre do cinema volta a um assunto recorrente em sua obra recente: Werner Herzog continua a explorar as histórias e vidas que habitam os corredores da morte. Em Corredor da morte II – Retratos, o cineasta volta sua câmera para quatro condenados a morte nos Estados Unidos. Parte da segunda temporada da minissérie que teve início em 2012, o projeto será exibido em quatro partes, uma dedicada a cada personagem: Blaine Milam, o mais jovem condenado do estado do Texas; Darlie Routier, que matou seus dois filhos a facadas; Douglas Feldman, condenado por matar a tiros dois motoristas; e Robert Fratta, que contratou dois assassinos para matarem sua esposa. Corredor da morte II – Retratos continua a pesquisa do diretor, depois de filmes como Into the Abyss.
Trazendo uma mistura de temas fortes e sempre atuais da nossa sociedade, a mostra Panorama – Grande Documentaristas presta homenagem a alguns dos nomes mais célebres do formato de hoje e de sempre.
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