Publicado em 09/10/2015

Nesta quinta-feira (8 de outubro) o Centro Cultural Justiça Federal recebeu mais uma acalorada sessão do Cine Encontro. O filme exibido (e depois debatido) foi o documentário Istambul – crônica de uma revolta, que registra de maneira bastante pessoal os protestos realizados por milhares de jovens turcos em 2013. Uma situação repleta de claros paralelos com a realidade no Brasil.

A conversa se iniciou com uma atualização das diretoras turco-alemãs, Biene Pilavci e Ayla Gottschlich, sobre o contexto da Turquia após as manifestações retratadas. Segundo elas, a representatividade de grupos minoritários no governo tem aumentado, ameaçando a hegemonia do autoritário presidente Erdogan, que teria iniciado uma guerra civil contra esses grupos. Os resultados das próximas eleições, a serem realizadas em novembro deste ano, são imprevisíveis. Enquanto isso, inúmeros manifestantes encontram-se encarcerados, e muitos outros estão sendo julgados, podendo pegar até vinte e nove anos de prisão.

O ativista de mídia Hare Brasil comparou a repressão turca à brasileira, lembrando que muitos de nossos manifestantes de 2013 também se encontram presos ou em julgamento, e que uma nova lei antiterrorismo – voltada, na prática, a coibir as manifestações populares – está para ser votada em breve, e deve tornar o direito do brasileiro ao protesto ainda mais restrito. Nesse contexto, Hare Brasil destacou a importância do ativismo ligado às redes de comunicação para quebrar o monopólio da mídia que impera no país, mostrando outras perspectivas, e do público geral como propagador dessas informações.

Nessa altura, o também ativista André Miguéis deu como exemplo o caso recente do Morro da Providência, em que moradores da comunidade conseguiram gravar e divulgar um vídeo que mostra policiais alterando uma cena de homicídio e forjando provas. Miguéis ressaltou que a violência policial que chocou a classe média nas manifestações de 2013 não é algo extraordinário – trata-se de um evento corriqueiro nas favelas, quase cotidiano, apesar de invisível para a população fora desses espaços. E, ao contrário do que se pensa, o povo dessas comunidades não está aceitando a situação passivamente, ele avisou.

A plateia então tomou conta do debate. Os elogios ao documentário foram numerosos, com membros do público louvando seu otimismo, sua coragem, seus momentos tocantes e declarando-o como um “ato de resistência global”. Lembrou-se da importância da arte nas transformações sociais, quebrando silêncios, apresentando novas realidades e gerando reflexões, e longos discursos foram feitos sobre as frustrações causadas pela realidade brasileira. Ao fim, Pilavci e Gottschlich retomaram a palavra para responder uma última pergunta, sobre o papel das mulheres no ativismo em um país tão opressor quanto a Turquia.

As diretoras responderam que as manifestantes do sexo feminino passam de fato por muitos problemas, principalmente ao serem presas, sofrendo frequentemente assédio sexual. Ainda assim, elas são incrivelmente numerosas e vocais nos protestos, inclusive exercendo papéis de liderança. E mais notável ainda, Pilavci e Gottschlich revelaram, é a união que tem surgido entre as mães dos soldados e dos rebeldes turcos (lados opostos) mortos na guerra civil. “Do encontro entre elas, talvez, venha o futuro”, sugeriu a mediadora Vik Birkbeck, encerrando o debate.

Texto: Clara Ferrer

Fotos: Carolina la Cerda




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