Entrevista: Mabel Lozano, diretora de Chicas nuevas 24 horas Longa da mostra Fronteiras analisa o tráfico sexual de mulheres na Europa
Este é o seu terceiro filme dedicado ao tema da exploração sexual. Quando você decidiu se dedicar uma série de filmes sobre um tema tão difícil, arriscado e marginalizado?
Fiz o meu primeiro longa metragem, Voces, contra la trata de mujeres (Vocês, contra o tráfico de mulheres), há 10 anos. Foi o primeiro filme na Espanha a tratar do assunto do tráfico para a exploração sexual. Ninguém conhecia esse tema. A pergunta geral era “Isso está acontecendo na Espanha?”. Mas só perguntaram por que eu estava contando a todos através do filme. Na realidade esse problema não importava aos espanhóis. Porque as vítimas não eram espanholas, não eram as nossas mulheres. Eram brasileiras, paraguaias, romenas ou peruanas. Era um crime que não nos interessava porque não nos afetava. Foi muito difícil que alguém confiasse nesse projeto, e levou bastante tempo para que as salas o exibissem. Mas esse primeiro documentário ajudou na formação de todos os órgãos de segurança do meu país. Não há nenhum policial, juiz ou fiscal na Espanha que não tenha assistido ao filme.
Depois fiz um curta de ficção chamado Escúchame (2010) que ganhou 33 prêmios dos grandes festivais de direitos humanos pelo mundo. Esse filme mostra a responsabilidade do cliente. Se este não cria a necessidade por esses serviços, não há mercado. E não se sequestra e explora as meninas.
E este novo longa faz parte de um projeto que se chama “Projeto Chicas nuevas 24 horas”. O título nasce de um anúncio que saía em um jornal na Espanha no qual anunciava garotas novas todos os dias. Essas mulheres estavam disponíveis 24 horas, todos os dias. Quem trabalha 24 horas? E todos os dias elas eram novas. Na Espanha o filme se transformou em um grande sucesso. A ponto de muitas pessoas tentarem assistir, mas não poderem porque seguidas sessões ficavam lotadas.
O filme vem sendo usado no ambiente educacional e tem sido traduzido para vários países com a intenção de alertar as meninas e educar os meninos. Você pode falar mais sobre isso?
Dublamos o filme para a língua guarani porque o exibimos para o presidente do Paraguai e aos deputados e eles acreditaram que seria algo de interesse cultural e social para o país. Com a dublagem conseguiremos levar a produção para 1.400 escolas a partir da próxima semana. Isso é muito importante por que é dessa região que muitas meninas são levadas para serem exploradas. É necessário que as ensinemos a dizer não. E a língua que elas falam é o guarani.
O filme também foi exibido na abertura do Congresso sobre os Direitos de Reprodução das Mulheres, onde se encontravam muitos magistrados latino-americanos. Traduzimos o filme também para o quéchua, para que o mesmo pudesse ser feito no Peru, e para região do Alto Andino.
Vivemos um momento muito importante de debates sobre machismo, misoginia e empoderamento feminino. A questão da exploração e escravização sexual ainda é muito pouco discutida, mas tem sido mais abordado ultimamente. Você acha que temos avançado nessas discussões de alguma maneira?
Eu acho que não. Acho que cada vez há mais tráfico na Espanha. Cada vez mais. E acho que o abismo social está cada vez maior por todo o mundo. Então sempre haverá meninas pobres, vulneráveis que não têm ferramentas para enfrentar a vida. E todas são captadas no Brasil, na Argentina, no Paraguai e são levadas para os lugares em que são exploradas na Europa. Na Espanha o tráfico cresce a cada dia. E são garotas de 42 nacionalidades. O mesmo está acontecendo na Itália, na Holanda, na Alemanha e por aí vai.
O problema tem a ver com a feminilização da pobreza, com a desigualdade de gênero, com a falta de recursos e de educação. Mas ninguém se aprofunda no problema. Porque tudo é imediato. Quando vocês publicarem esta entrevista, em um minuto vem outra. E esta já não vale mais. Já está morta, velha. Hoje em dia é assim.
E qual vai ser o seu próximo projeto cinematográfico sobre este assunto?
Agora vou para a Bolívia para apresentar este filme em um festival em Santa Cruz de la Sierra. Mas estou há três anos investigando sobre as tatuagens tribais que são feitas em mulheres da África Subsaariana. Eles as tatuam no rosto para marcá-las, como se fossem gado, para quando chegarem na costa Europeia serem reconhecidas pelos traficantes que já lhes apontam “Esta é minha, aquela é sua”. Este é um curta-metragem que vou fazer quando voltar à Espanha.
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