Publicado em 13/10/2023

Em Cinco da Tarde, drama que compete na Première Brasil, o público é convidado a experimentar o tempo de uma forma mais vagarosa e solene, com um olho voltado para as sutilezas, explica o diretor Eduardo Nunes.

O cineasta fluminense e a equipe do longa-metragem falaram sobre o projeto em um debate no Cine Odeon - CCLSR realizado nesta sexta (13/10), mediado pelo crítico Luiz Carlos Merten, que chegou a estabelecer uma ponte entre aspectos do trabalho exibido no Festival do Rio e Depois da Vida (1998), de Hirokazu Kore-eda.

Tendo o luto e a possibilidade de imaginar a vida voltando a florescer após a perda de alguém importante como tema, o filme tem uma cadência lenta, com muitos planos longos e momentos de silêncio, assinatura autoral que o diretor também exibe em seus outros trabalhos ficcionais em longa-metragem. O diretor fluminense já realizou Sudoeste (2011) — vencedor do Prêmio Especial do Júri, do Prêmio Fipresci e do Troféu Redentor de Melhor Fotografia no Festival do Rio — e Unicórnio (2017).

A trama acompanha a jovem Anabel, interpretada por Bárbara Luz, que tenta assimilar a dor que sente pela morte recente de sua avó e se aproxima de sua vizinha, Meiko, vivida por Sharon Cho. Durante o processo de luto, Anabel experimenta sensações que borram a fronteira entre a presença e a ausência. “São duas pessoas muito solitárias, que sofreram perdas, estão machucadas, mas cada uma lida de uma forma”, comenta Nunes. “Elas mal verbalizam o que pensam uma para a outra. Em muitos dos silêncios, dos olhares e das formas como elas não dizem as coisas é que você vai perceber o que acontece com cada uma delas.” 

Sharon Cho, que vive a tímida Meiko, comentou no debate que desenvolver sua personagem com Eduardo Nunes serviu para que ela aprimorasse sua capacidade de “falar muito com os olhos” ao atuar. 

O diretor conta que quis construir uma “atmosfera de melancolia e tristeza” ao optar por filmar o longa-metragem em preto e branco. A trama se passa em Niterói, cidade natal do cineasta, e grande parte das cenas são ambientadas no interior de apartamentos. Com muitos enquadramentos em contraluz e personagens subexpostos, fotografia buscou uma abordagem naturalista para iluminar personagens, afirma Mauro Pinheiro, diretor de fotografia. Ele ainda considera que estética do longa-metragem contribui para fabulações que se apresentam na trama no desenrolar da relação entre Anabel e Meiko. “O preto e branco ajuda a gente a tirar um dos pés do chão e descolar da realidade.”

Miwa Yanagizawa, que faz parte do elenco de Cinco da Tarde, elogiou a dimensão emocional que a história carrega. “Nossos sentimentos, o que a gente sente, imagina e sonha, não são abstrações. O encontro das duas personagens e das duas atrizes é tão bonito. A gente vê e sente que o afeto é real.”

Para Nunes, a produção do longa-metragem foi marcada pela nostalgia. Alguns lugares filmados na cidade de Niterói fizeram parte da infância do cineasta, como o Campo de São Bento e a Igreja Porciúncula de Sant’Ana. “É o primeiro filme que eu gravo na minha própria cidade. É um filme muito pessoal para mim e talvez, sem eu perceber, esteja carregado dessas memórias.”

Texto: João Vitor Figueira
Foto: Ian Melo



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