Betânia: filme de Marcelo Botta é um tributo ao Maranhão e à força de suas mulheres Exibido na mostra Panorama do Festival de Berlim, o filme integra a competição da Première Brasil no Festival do Rio. No Odeon, diretor, elenco e equipe do filme apresentaram o projeto, que cineasta define como 'uma declaração de amor ao Maranhão em forma de filme'
Elenco e equipe de Betânia no Cine Ondeon - CCLSR - Foto: Kayane Dias
Por João Vitor Figueira
A Cinelândia se tornou, ainda que apenas por algumas horas, um pedaço do Maranhão localizado no Rio de Janeiro. Na noite de segunda-feira (7), o Cine Odeon - CCLSR recebeu uma sessão do longa-metragem Betânia, filme que marca um novo patamar na carreira do cineasta paulista Marcelo Botta como realizador. O longa celebra o povo, a cultura popular e as belezas naturais do estado nordestino que tem um “deserto” de dunas à beira-mar.
Exibido na mostra Panorama do Festival de Berlim, o filme integra a competição da Première Brasil no Festival do Rio. No Odeon, diretor, elenco e equipe do filme apresentaram o projeto, que Botta define como “uma declaração de amor ao Maranhão em forma de filme”.
Betânia, de Marcelo Botta
A personagem principal, que dá nome ao filme, é interpretada por Diana Mattos, que faz sua estreia como atriz no papel de uma matriarca que é a força motriz da narrativa e estrela-guia de sua família. Aos 64 anos, Betânia é entra em cena enlutada após enterrar seu marido, morto devido às dificuldades da vida no ambiente salino.
Ela mora isolada nos Lençóis Maranhenses, mas é convencida por seus familiares a viver em um povoado que, com apenas 300 habitantes, não é nenhuma metrópole, mas conta com internet e energia elétrica. O filme explora os conflitos geracionais, mas principalmente os afetos próprios dessas dinâmicas familiares.No enredo, há ainda espaço para reflexões sobre as inevitabilidades da vida, amadurecimento, pertencimento cultural e resiliência.
A relação de Botta com o Maranhão teve início com sua admiração pelo reggae, gênero muito apreciado no estado e incorporado ao filme, no qual a música desempenha um papel central, seja nas radiolas, nos cantos ancestrais, no tambor de crioula ou nos sons de matraca, pandeirão, tambor-onça, zabumba e maracá típicos do bumba-meu-boi do Maranhão.
Betânia, de Marcelo Botta
Já o projeto de Betânia começou a ser gestado em 2018, quando o cineasta fez um documentário sobre Dona Maria do Céu, uma parteira que inspira o espírito indomável da personagem principal. Quando decidiu fazer este filme de ficção, o cineasta viajou para os Lençóis Maranhenses para escrever o roteiro para se inspirar na atmosfera do local que define como “vibrante, solar e de muita alegria”.
Em sua pesquisa por diferentes povoados, o diretor se fascinou com o protagonismo feminino daquelas comunidades. “As mulheres são realmente quem cuida, quem educa e formam as pessoas. É uma sociedade muito matriarcal”, pontuou o diretor.
Diana Mattos compartilhou com o público a sua emoção por interpretar Betânia, citando ter sido descoberta para o cinema por Botta e relatando como foi essa experiência, até então inédita em sua vida. “Eu me preparei, mas cada cena tinha uma surpresa, emoções diferentes. Tudo para mim foi encantamento”, disse a atriz. Ela também destacou a importância de ter um filme com “elenco 100% maranhense”, afirmando: "O cinema é uma oportunidade de intercâmbio cultural para mostrarmos nossa cultura, nossa regionalidade e nossas mulheres fortes, que são resistência e representatividade."
Betânia, de Marcelo Botta
O sentimento de orgulho maranhense marcou as falas de todo o elenco presente no Odeon. Com a voz embargada, Nádia D' Cássia, que interpreta Vitória, chorou de emoção ao citar que pensou em desistir de ser artista antes de atuar em Betânia, mas que o filme lhe deu uma chance de viver uma experiência que ela quer que se repita mais vezes, com um elenco que traz talentos maranhenses e é majoritariamente negro. A fala da atriz encontrou ressonância no discurso de Caçula Rodrigues, que vive Tonhão, personagem que representa a importância do turismo para a região e que, como Diana, fez seu primeiro trabalho como ator no longa.
Vitão Santiago, ator e comediante que integra o elenco, citou outro elemento, para além das ricas tradições culturais, que, segundo ele, marcam o povo maranhense e estão refletidas no filme. “Há esse choro de tristeza que logo se transforma em alegria, esse olhar marejado que logo se reflete em esperança, algo que Diana fez muito bem”, analisou. A cantora Enme Paixão, que interpreta uma DJ de reggae no filme, instigou a plateia carioca a buscar mais referências culturais de seu estado: “Existem potências no Maranhão só esperando o momento de todo mundo começar a olhar”.
Betânia, de Marcelo Botta
Também presente no tom da fala de todos os membros da equipe estava a noção de que atuar no filme fez deles uma grande família. Bruno Graziano, diretor de fotografia, disse que foi um deleite trabalhar no longa e que buscou dar muita naturalidade para a estética de Betânia. “É um filme de ficção, muito elaborado, mas com uma alma documental”, pondera.
Ao final do debate, Mestre Tião Carvalho, cantor, compositor e educador que levanta a bandeira da música tradicional maranhense, animou um cortejo que começou na sala do Odeon e tomou a Praça Floriano, atraindo os espectadores do filme, transeuntes e curiosos. Veja algumas fotos a seguir:
Cortejo de bumba-meu-boi após a sessão de Betânia - Foto: Kayane Dias
Cortejo de bumba-meu-boi após a sessão de Betânia - Foto: Kayane Dias
Cortejo de bumba-meu-boi após a sessão de Betânia - Foto: Kayane Dias
Cortejo de bumba-meu-boi após a sessão de Betânia - Foto: Kayane Dias
Leia também:
- Manas: denúncia e sensibilidade marcam drama sobre exploração sexual na Ilha do Marajó com Dira Paes no elenco
- 3 Obás de Xangô: filme destaca arte, amizade e religiosidade de Dorival Caymmi, Jorge Amado e Carybé
- Avenida Beira-Mar: Niterói bucólica dá espaço para brincadeira de criança e questões adultas
- Com histórias baseadas em adaptações de contos, Insubmissas explora possibilidades da experiência feminina
- Diretor Pablo Trobo convida o público a ver Os Sonhos de Pepe: 'É um filme de artesão, feito por humanos, não por algoritmos'
Voltar