Publicado em 14/12/2021


Dando prosseguimento aos debates da Première Brasil, a segunda sessão do dia 13/12 agregou o curta Solitude, de Tami Martins e Aron Miranda, e o longa Meu tio José, de Ducca Rios. No Estação NET Botafogo, Ducca e Tami dialogaram com espectadores e o mediador Marcelo Müller, crítico de cinema que definiu a exibição em conjunto como "emblemática".

O caminho mais simples é pensar na aproximação das duas obras por serem animações, mas a ligação pode ser encarada por um viés mais profundo. O curta de Tami traz uma protagonista à procura da liberdade após um relacionamento abusivo e a realizadora comenta que enxerga nessa busca pelo lugar da voz própria uma conexão com o longa-metragem de Ducca, um relato bem pessoal e familiar sobre perseguição política.

O realizador diz que começou a construir a história do filme quando tinha dez anos, justamente quando aprendeu o que era ditadura militar a partir do crime cometido contra seu tio. Unindo autobiografia e ficção, ele fez o roteiro em 2013 e iniciou a produção em 2014. Um processo longo e árduo, que o cineasta descreve como "curioso" por conta das reviravoltas políticas que ocorreram desde então e que resultou numa obra que ele considera especial por seu aspecto premonitório e cíclico, como um buraco de minhoca de uma dimensão passada para uma atual.

A dedicação da equipe de Tami também vem de longa data. Solitude foi contemplado no primeiro - e até o momento último - edital audiovisual do Amapá, em 2017. Nada saiu do papel até o ano seguinte, por atraso no financiamento, e foram dois anos de execução da ideia, nascida de ilustração feita pela diretora (que também é designer) pensando no sentimento de estar bem e feliz enquanto só. O trabalho, no entanto, não teve nada de solitário, contando com colaborações de outros artistas, como coreógrafos, e muita entrega dos animadores, que desenharam frame a frame.

Ducca conta que Meu tio José foi feito 80% em cut out (técnica que utiliza recortes) por conta do orçamento e a estética tomou como inspiração movimentos artísticos em evidência no Brasil nas décadas retratadas na trama, especialmente o concretismo e o minimalismo. Outra influência forte foi longa-metragem Persépolis, em todos os sentidos. O realizador revela que seu objetivo é se comunicar com quem não viveu o período da ditadura, explicar as coisas ao pré-adolescente, para isso muitas vezes adotando de propósito um tom professoral.

Antes de encerrar os realizadores clamaram o retorno das políticas públicas, sem as quais a animação brasileira torna-se inviável.

Texto: Taiani Mendes
Foto: Frederico Arruda

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