Fernanda Montenegro é homenageada em pré-estreia de Ainda Estou Aqui e celebra Walter Salles: 'Parte da nossa vida' Premiado no Festival de Veneza, longa-metragem baseado no livro biográfico de Marcelo Rubens Paiva representa o Brasil na disputa por uma indicação ao Oscar de melhor filme internacional
Walter Salles, Fernanda Montenegro, Fernanda Torres e Selton Mello na sessão especial de Ainda Estou Aqui no Festival do Rio — Foto: Alexandre Macieira
Por João Vitor Figueira
Após percorrer o mundo com uma história comovente sobre memória e família, chegou a vez do aguardado longa-metragem Ainda Estou Aqui estrear na cidade onde o mais recente filme dirigido por Walter Salles foi rodado.
Na noite da última segunda-feira (21), o filme teve sua première carioca em uma sessão especial promovida pelo Festival do Rio no Cine Odeon - CCLSR. A cerimônia, marcada por homenagens e muita emoção, contou com a presença do cineasta e do elenco do drama que representa o Brasil na disputa pelo Oscar de melhor filme internacional em 2025.
Entre os nomes do elenco que representaram o filme no tapete vermelho e no palco do Odeon figuravam personalidades como Fernanda Torres, Fernanda Montenegro, Selton Mello, Valentina Herszage, Humberto Carrão e Camila Márdila.
Ilda Santiago, diretora do Festival do Rio, se disse honrada por poder apresentar o longa-metragem, na sessão que definiu como “uma noite de encontro de todos nós brasileiros com a história do Brasil”.
Considerada a primeira-dama da dramaturgia do país, Fernanda Montenegro foi ovacionada pelos mais de 500 convidados que lotaram o Odeon para prestigiar o filme na pré-estreia, recebendo das mãos de Ilda Santiago um buquê de flores em nome do Festival do Rio. Além disso, os presentes também se uniram em coro para cantar “Parabéns Pra Você” para a atriz, que completou 95 anos no último dia 16 de outubro.
Fernanda Montenegro foi homenageada na sessão especial de Ainda Estou Aqui no Festival do Rio — Foto: Alexandre Macieira
“Eu recebo essas flores em nome dessa gloriosa equipe. Todo mundo teve emprego!”, brincou a atriz, arrancando risadas da plateia. “Certamente, sou a pessoa mais velha dentro deste cinema. Então, muito obrigada.”
Após dizer que sente como se já tivesse completado 100 anos, a celebrada atriz se disse grata por ter “uma vida ainda consciente” e por poder lançar o filme ao lado de “um elenco maravilhoso” e de sua “filhinha”, Fernanda Torres, protagonista de Ainda Estou Aqui com uma atuação elogiada que tem atraído especulações sobre uma possível indicação ao Oscar. Montenegro também disse que o fazer cinematográfico precisa buscar uma “ação transcendente” e que toda a equipe do filme esteve empenhada para trazer sensibilidade e poesia para o projeto.
Ainda Estou Aqui teve uma passagem destacada pelo Festival de Veneza, onde atraiu muitos elogios da crítica especializada e venceu o prêmio de melhor roteiro, além de ter passado por festivais de Toronto, Londres e Nova York. A première no Rio de Janeiro, entretanto, foi a primeira a contar com a presença de todo o elenco principal, incluindo Montenegro, artista que desde 2022 é uma das imortais da Academia Brasileira de Letras.
Fernanda Montenegro é aplaudida na sessão especial de Ainda Estou Aqui no Festival do Rio — Foto: Alexandre Macieira
“Walter, você faz parte da nossa vida mais arriscada, no melhor sentido, da ambição da realização de sonhos dentro do cinema brasileiro”, disse Montenegro ao se dirigir ao cineasta com quem trabalhou em Central do Brasil (1998), clássico do cinema nacional que fez da brasileira a primeira latino-americana a ser indicada ao Oscar de melhor atriz. “Eu ficaria aqui falando sem parar, porque não esvazia. Quero agradecer. Vamos todos agradecer à gente ter essa capacidade de dar conta de sonhos.”
Walter Salles lembrou que anos antes, no mesmo Festival do Rio, dividiu o palco do Odeon com Fernanda Torres para apresentar a versão restaurada de Terra Estrangeira (1995), dirigido por ele em parceria com Daniela Thomas, na 23ª edição do evento, citando que festival “revive a cinefilia brasileira todos os anos”.
O cineasta agradeceu ao escritor Marcelo Rubens Paiva, uma vez que o projeto de Ainda Estou Aqui “jamais existiria sem” ele, e citou que o longa-metragem é fruto de sete anos de muito trabalho. “Nesse livro luminoso ele repassa a vida dos seus pais, um deles é a Eunice Paiva, ao mesmo tempo ele repassa a história do Brasil ao longo dos últimos anos e oferece um reflexo”, disse o cineasta. “Foi isso que a gente tentou captar. Um filme sobre uma família feito por uma família de cinema.”
Elenco e equipe de Ainda Estou Aqui no palco do Cine Odeon - CCLSR — Foto: Alexandre Macieira
Citando Andrei Tarkovsky, o diretor disse ainda que no processo cinematográfico, todos os profissionais, na frente e atrás das câmeras, precisam estar “na artéria do filme” e convidou cada pessoa que trabalhou na produção de Ainda Estou Aqui para dividir o palco com ele e com o elenco principal. “O fazer do filme é frágil. E se ele não for muito bem abraçado ele não vai para a frente”, disse.
Ainda Estou Aqui é um filme que trata das feridas abertas pela ditadura militar no Brasil e na resiliência de uma família a partir da literatura autobiográfica de Marcelo Rubens Paiva, autor do livro homônimo no qual o projeto se baseia.
A protagonista, do livro e do filme, é Eunice, personagem de Fernanda Torres, que cria seus cinco filhos no Rio de Janeiro da década de 1970, em meio ao endurecimento do regime militar no Brasil. Selton Mello interpreta o ex-deputado Rubens Paiva, o pai da família que foi levado de sua casa por agentes da ditadura à paisana e desapareceu para sempre. A busca por justiça e verdade permeia décadas de luta na família Paiva, que se vê diante do desafio de se reinventar e não perder o rumo.
Fernanda Torres e Selton Mello no tapete vermelho do Cine Odeon - CCLSR — Foto: Alexandre Macieira
Valentina Herszage, que já atuou em filmes sobre a ditadura militar como O Mensageiro, de Lúcia Murat, e A Batalha da Rua Maria Antônia, de Vera Egito — ambos exibidos no Festival do Rio 2023 —, considera que Ainda Estou Aqui reforça a importância da luta por memória e justiça. Em entrevista exclusiva, a atriz, que interpreta uma das filhas de Eunice, relembrou que os torturadores do regime não foram condenados por seus crimes.
“Rubens, na época em que foi preso, não era mais deputado. Existiu uma perseguição muito real, uma repressão muito grande e é essencial que a gente escancare isso”, disse. Ela também considera que o retrato proposto pelo filme de Walter Salles aborda o tema da ditadura militar com uma veia autoral própria. “Esse filme vem com a maior elegância, que eu considero ser a sensibilidade de tratar de uma família real, uma família feliz”, diz.
Valentina Herszage no tapete vermelho do Cine Odeon - CCLSR — Foto: Alexandre Macieira
Ciente das especulações que colocam Ainda Estou Aqui como um forte candidato a uma nomeação ao Oscar, Valentina celebrou o carinho que o filme tem recebido do público brasileiro. “O brasileiro é o melhor que tem, gente. Fazemos a melhor torcida sempre”, comemorou, citando também o apoio que o filme ganhou no país após ser premiado em Veneza.
“A gente ter sido tão bem recebido lá fora dá uma cara para o nosso cinema, dá uma moral, um respeito, que a gente merece, porque a gente vem fazendo filmes incríveis e passando por momentos difíceis. Não é fácil fazer cinema. Então a gente entregar os filmes que a gente entrega, falando de história, sobre política, sobre histórias, como nesse filme do Walter Salles, acho que é a melhor coisa para a nossa cultura, sabe?”
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