7 CORTES DE CABELO NO CONGO: VOZES CONTRA O IMPERIALISMO DEBATE COM TOM FORTEMENTE POLÍTICO NA PREMIERE BRASIL
O primeiro debate da Première Brasil na sexta-feira (14) foi em torno do filme 7 Cortes de Cabelo no Congo, de Luciana Bezerra, Gustavo Melo e Pedro Rossi. Juntamente com o congolês Yanick Mbau, um dos retratados no documentário, os realizadores participaram de uma conversa com o público mediada pelo jornalista e crítico de cinema Luiz Carlos Merten.
Primeiro a falar, Pedro Rossi contou que o trio de realizadores tem mais de vinte anos de amizade e se conheceu no núcleo de cinema do Nós do Morro. O projeto surgiu quando ele foi fazer um trabalho em Angola e, ao retornar, continuou pesquisando angolanos no Rio de Janeiro. Gustavo indicou um salão de beleza perto de sua casa, mas, chegando lá, eles descobriram que na verdade era um reduto de congoleses.
Isso aconteceu há dez anos e assim eles conheceram Pablo, o carismático protagonista do documentário. “O Pablo tem uma gravidade enorme, você gravita em torno dele, ele atrai muito... E acho que ficou uma dívida nossa, de querer voltar [...]. A gente fez esse registro e ficou uma dívida, porque nunca fizemos nada com o material, ficou guardado por anos”, explicou Rossi. Luciana Bezerra comentou que o formato nasceu da dificuldade, pois o projeto foi feito com recursos limitados e durante a pandemia. Sabendo que não poderiam filmar nas casas e na comunidade, eles pensaram no dispositivo do salão, onde as discussões acontecem de fato.
Yanick Mbau, vice-presidente da comunidade da República Democrática do Congo no Brasil, afirmou que todas as pessoas presentes no Cine Odeon tinham um pedaço do Congo no bolso, pois o país sustenta a indústria eletrônica mundial com suas riquezas naturais. Esses materiais valiosos, no entanto, saem ilegalmente, em cima do sangue da população, e continuam enriquecendo colonizadores. Yanick mencionou que 60% da reserva mundial de cobalto está lá e criticou bastante o neocolonialismo, que estimula a desestabilização do país – e de várias partes do continente africano – para obter vantagens. Ele lembrou que, apesar da independência, os países africanos ainda vivem a espiritualidade, política e línguas da colonização, e que o poder depende mais do ocidente do que do próprio povo de cada nação.
Ausente da sessão por estar viajando, Pablo, referência da comunidade congolesa no bairro de Brás de Pina e no Brasil, está aqui há décadas e foi quase o quarto diretor do filme, além de ator. Sempre interessado em propagar seu discurso, ele ajudou a achar os personagens e conduziu as conversas, sendo descrito por Luciana como um “parceiro em todos os sentidos”. Ela ainda destacou a preocupação da equipe com que as pessoas ficassem confortáveis e livres nos bate-papos, requisitando desde o início que elas falassem em suas línguas e não em português. Por conta disso, muito do teor do filme só foi compreendido mesmo na montagem, após a tradução completa dos diálogos.
Texto: Taiani Mendes
Foto: Francisco Ferraz
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