Publicado em 10/10/2015

O sábado (10 de outubro) no Odeon começou animado, com um Cine Encontro sobre Crônica da demolição, documentário de Eduardo Ades que traça um panorama sobre a urbanização do Rio de Janeiro e a reordenação do espaço a partir da história do Palácio Monroe. O prédio, construído no início do século XX na Cinelândia e outrora sede do Senado Federal, foi derrubado em meio a um processo que coloca em xeque a relação da cidade com seu patrimônio arquitetônico.

A conversa, mediada pela jornalista Cristina Grillo, começou com a pergunta-chave do longa: Afinal, por que o Palácio Monroe foi demolido? Alex Nicolaeff, um dos arquitetos entrevistados, foi enfático: "A razão fundamental é a cobiça. Aquele terreno era valiosíssimo. Não dá para falar que foi por causa do metrô, porque quando se determinou o plano da linha ela já contava com um desvio para preservar o prédio". Indo mais a fundo na questão, Nicolaeff observou que "a arquitetura é uma arte social. Qualquer reforma e construção gasta muito dinheiro. Aquele prédio foi fruto do dinheiro da sociedade, mas houve uma convergência de fatores sociais, políticos e econômicos que levou à sua demolição. O coletivo não estava mais interessado no Monroe".

A arquiteta Margareth da Silva Pereira ressaltou que, apesar de a arquitetura não assegurar as relações sociais, há um grave problema na arbitrariedade de algumas ações. "Quando retiraram a capital do Rio e foram pouco a pouco desconstruindo esse complexo de edifícios históricos no Centro, começou a haver uma dificuldade de manter a questão política no dia a dia, nas relações miúdas, em discutir uma coisa que foi debatida no senado, por exemplo. Antes os assuntos saíam de um prédio e iam escorrendo pelas ruas, entravam nos bares, nos cafés, na escadaria do Teatro Municipal, em uma livraria... Houve um esvaziamento dessa esfera pública, é um vácuo político. É até difícil para mim, que sou professora, ver um aluno e um cidadão pensar a cidade estando tão afastado dela", disse. 

Eduardo Ades, responsável por produção, direção e roteiro da obra, além da montagem, que divide com Eva Randolph, revelou que a pesquisa durou um ano, e separou-se em dois ramos: o da história, que assumiu, e o da iconografia, no qual destacou o brilhante trabalho de Remier Lion. "O processo foi um pouco investigativo, a gente precisava entender o que tinha acontecido", explicou. Questionado sobre o levantamento e a preservação dos arquivos usados, Ades contou que passou horas na Biblioteca Brasileira, no Arquivo Nacional, na Cinemateca e em vários outros lugares que zelam pelo armazenamento de documentos, e destacou a importância deles para a ordenação e a salvaguarda da memória do país. "Sem a cessão dos detentores desses materiais o filme não teria sido possível", falou, completando que "trabalhar com material de arquivo é sofrido, mas é delicioso, porque você descobre coisas o tempo todo. Você vai percorrendo eles e descobrindo. Não foi você que filmou, então não há um domínio total, você vai encontrando detalhes, acasos".

O público, repleto de arquitetos, estudiosos e interessados, manteve-se participativo e fez belas contribuições ao debate. Levantaram a importância de Crônica da demolicão como documento de conscientização, e ainda sublinharam a necessidade de se defender as áreas públicas, refletindo sobre a transformação desses espaços em "não lugares", esvaziados de vida. 

Nicolaeff definiu o trabalho de Ades como "extraordinário", e Pereira concluiu: "Eu quero dizer que o filme é lindo. É comovente, e a pesquisa é supersofisticada. Eu só tenho a agradecer a essa geração nova, essa gente jovem que está tendo interesse em pensar a cidade e em imprimir isso em seus filmes".

A conversa, que não parecia estar perto do fim, continuou a caminho da Praça Mahatma Gandhi, onde a equipe do documentário demarcou no chão os contornos do antigo Palácio Monroe. A instalação está aberta à visitação até o dia 12 de outubro.

Texto: Juliana Shimada

Fotos: Natália Alvim



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